Brasil se prepara para leilão do 6G com previsão de R$ 50 bilhões em investimentos
Consulta pública será aberta em agosto, e edital está previsto para outubro de 2026; nova geração trará integração nativa com IA e realidade estendida
O Brasil deu os primeiros passos concretos rumo à sexta geração da conectividade móvel, o 6G. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) anunciou nesta quarta-feira, 14, durante o Summit Tecnologia e Inovação, realizado pelo Estadão, que abrirá uma consulta pública em agosto sobre o uso da faixa de 6 GHz e que o edital do leilão está previsto para outubro de 2026. O valor estimado de investimentos com a nova rodada gira em torno de R$ 50 bilhões, segundo Vinícius Caram, conselheiro substituto da Anatel. A nova geração terá integração nativa com inteligência artificial, transformando radicalmente a forma como pessoas e máquinas se comunicam.
"A gente nem gosta de falar de valores, a gente gosta de falar de conectividade para o Brasil", afirmou Caram. O foco, segundo ele, é usar os leilões como instrumentos de inclusão digital, com compromissos atrelados à expansão de infraestrutura em áreas hoje não atendidas.
"A gente precisa fazer leilões com políticas públicas para melhorar a conectividade da população brasileira", disse Caram, mencionando que os investimentos estimados incluirão a instalação de torres, fibra óptica e estações rádio base em escolas, estradas e regiões isoladas.
Segundo o conselheiro, o leilão seguirá o modelo adotado no 5G, com contrapartidas em políticas públicas elaboradas pelo Ministério das Comunicações e pela presidência. "A gente precisa fazer leilões com políticas públicas para melhorar a conectividade da população brasileira. A gente tem 80% da área geográfica não coberta, então temos de levar a cobertura o máximo (do território nacional) possível", disse.
Caram explicou que a faixa de 6 GHz será dividida: uma parte significativa será destinada ao Wi-Fi 7, enquanto de 500 a 700 MHz serão alocados para redes móveis, incluindo 5.5G e 6G. "Essa frequência intermediária se encaixa perfeitamente para que o brasileiro tenha 6G pensando em redes móveis com mobilidade", afirmou.
Como será a integração com IA
A integração com inteligência artificial será uma das marcas centrais do 6G. Segundo Luciano Mendes, professor do Inatel, a IA atuará em duas frentes: ajudará a tornar a operação da rede mais eficiente e menos custosa e será viabilizada pela própria infraestrutura do 6G, que dará suporte a novas aplicações baseadas em IA, como carros autônomos e sistemas avançados de automação.
Para Mendes, a nova geração de redes poderá até mesmo tornar os celulares obsoletos. "Eu espero não termos celulares na sexta geração", afirmou. Ele prevê um futuro em que dispositivos vestíveis, como relógios ou óculos inteligentes, substituam os aparelhos tradicionais.
Carlos Lauria, diretor de relações governamentais da Huawei, explicou que, diferentemente do 5G, voltado ao mercado corporativo, o 6G trará benefícios diretos ao usuário final. "Você vai ter hologramas sem o uso de óculos especiais. Você vai ter sensores físicos onde você pode botar luvas, onde você possa conversar com uma pessoa distante e abraçar essa pessoa", disse.
Uma das características mais inovadoras do 6G será o uso da rede como um grande sensor. "Essa grande densidade de antenas vai permitir você localizar objetos, saber o tamanho deles, a forma, a velocidade e a direção. Isso vai permitir a criação dos gêmeos digitais", explicou Hugo Baeta, diretor de Redes Móveis para Brasil e Cone Sul da Nokia, convidado para o painel. Gêmeos digitais são réplicas virtuais de objetos físicos, atualizados em tempo real a partir de dados.
A expectativa da indústria é de que a padronização inicial do 6G esteja concluída em 2027 ou 2028. Já o lançamento comercial poderá ocorrer em 2030, conforme apontou Hugo.
Brasil está no pódio em qualidade de 5G
Enquanto o futuro se desenha, o Brasil ainda vive os desdobramentos da implantação do 5G. Caram destacou que o País conta hoje com "45 milhões de brasileiros com aparelho 5G" e "1200 cidades com estações 5G", o que posiciona o Brasil como o "terceiro País em termos de qualidade de 5G".
Essa qualidade se deve, segundo Lauria, ao fato de o Brasil ter adotado desde o início o modelo standalone (SA), o chamado "5G puro". Apesar do avanço técnico, a percepção do usuário ainda é limitada.
Mendes afirmou que o 5G não foi totalmente percebido por quem usa smartphones. "As aplicações que podem ser inovadoras sobre a rede 5G não são aquelas que são baseadas nos smartphones, mas sim na internet das coisas (IoT), no uso industrial da rede 5G", comentou.
Como solução para levar conectividade a áreas remotas, a integração com satélites tem ganhado força. "Uma das ideias consolidadas é integração às redes não terrestres, basicamente, redes satélite", disse Lauria.
Mendes também destacou que o 5G já abriu essa porta: "Essa integração com satélite, que é uma abertura de porta dada pelo 5G no núcleo da rede, pode quebrar um monte de novos paradigmas".
Além disso, o 6G trará como características nativas a eficiência energética — conceito descrito por Lauria como "zero bit, zero watt" — e segurança cibernética embutida desde o projeto.
O leilão do 5G realizado em 2021 já havia movimentado R$ 47 bilhões em compromissos de investimento, segundo Caram. A nova rodada, com estimativa ainda maior, reforça a ambição do Brasil de estar entre os protagonistas da conectividade global — agora com os olhos voltados para 2030.
