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Em livro, estudante de Medicina francês denuncia racismo e discriminação nos hospitais

O jovem francês Miguel Shema está no 5° ano de Medicina da Faculdade de Iasi, na Romênia. Apesar de passar boa parte do tempo mergulhado nos livros de sua área, ao longo dos anos ele começou a questionar a maneira como os pacientes negros e de outras etnias são atendidos nos hospitais.

13 mai 2025 - 11h27
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O jovem francês Miguel Shema está no 5° ano de Medicina da Faculdade de Iasi, na Romênia. Apesar de passar boa parte do tempo mergulhado nos livros de sua área, ao longo dos anos ele começou a questionar a maneira como os pacientes negros e de outras etnias são atendidos nos hospitais. 

Taíssa Stivanin, da RFI em Paris

Essas são algumas das reflexões que o estudante de Medicina francês relata em seu livro "La Santé est Politique" (A Saúde é Política, em tradução livre), onde denuncia a discriminação de alguns profissionais da saúde. 

De acordo com ele, esse preconceito se manifesta de maneira inconsciente, ancorado em vieses cognitivos que "enganam" o cérebro na hora de tomar decisões.  

O livro de Miguel é resultado de observações feitas em estágios nos hospitais franceses. Na obra, ele cita casos reais que escandalizaram a opinião pública, como o da jovem francesa de origem africana Naomi Musenga, 22 anos, que vivia em Estrasburgo, no leste do país.   

Em 2017, vítima de fortes dores no abdômen, ela morreu por falta de atendimento. Horas antes, Naomi ligou para o Samu, o 192 francês, e foi ignorada pela atendente, que minimizou seu caso e a mandou procurar um médico. 

"Eu me interessei pelas Ciências Sociais no ensino médio. Tinha necessidade de entender por que eu passava por algumas situações e porque eu era alvo de insultos na escola. Precisava também entender o racismo que eu mesmo vivenciei", explica.

Foi nessa época que Miguel Shema passou a escrever artigos para o site francês Bondy Blog, criado para dar voz aos moradores dos subúrbios franceses. Uma de suas inspirações é o psiquiatra e militante martinicano Frantz Fanon, que em 1952 escreveu um célebre artigo descrevendo a Síndrome Norte-africana, "que questiona o racismo e o desprezo dos médicos pela dor do paciente", explica Miguel. 

Nesse mesmo período ele teve contato, pela primeira vez, com conceitos até então desconhecidos para ele, como a chamada Síndrome Mediterrânea. "É uma crença, um viés cognitivo, que alguns profissionais da saúde têm. Eles consideram que os magrebinos teriam uma propensão a exagerar a dor".  

A pandemia de Covid 19 também influenciou o engajamento do jovem francês. Miguel lembra que, em 2020, quando o vírus começou a se espalhar por toda a França, a população de alguns subúrbios de Paris foi acusada de contribuir para a propagação Sars-CoV-2 - por desrespeitar o lockdown e outras medidas restritivas.

"Foi um momento de grande indignação. Ainda temos discursos distantes da realidade epidemiológica, política, social ou médica. Foi a partir daí que criei uma conta nas redes sociais, @sante_politique, e tive a vontade de questionar a relação de dominação existente entre os profissionais da saúde", acrescenta.  

"Médicos não têm como medir a dor"

Durante seus estágios nos hospitais da capital e da região, Miguel, como observador, não podia intervir nas situações de abusos que testemunhava. Mas anotava tudo que poderia ilustrar o racismo e o preconceito presentes nos estabelecimentos. A questão da dor, e como os profissionais a avaliavam em função do paciente, foi para ele uma das mais marcantes.

"Os médicos não têm como medir a dor. Considerar que ela é mais ou menos forte é uma questão puramente social. Acreditamos ou não em nossos pacientes. O que estou tentando dizer é que na Medicina francesa existe ainda a crença de que o olhar do clínico é neutro, mas na verdade ele não é. E a maneira como enxergamos o paciente vai influenciar na forma como avaliamos a dor dele", observa.  

Parlez-vous français?

O estudante de Medicina também ficou surpreso com a falta de intérpretes para ajudar os pacientes que não falam francês nos hospitais, sendo que os estabelecimentos do país têm esse recurso à disposição. 

Segundo ele, após a consulta, o laudo é entregue em francês, e o paciente que fala uma língua diferente ou que não domina o idioma, em alguns casos acaba até abandonando o tratamento se não tiver a orientação adequada. "Se queremos cuidar direito das pessoas, se temos a pretensão de ser um sistema de saúde que atende todo mundo, temos que respeitá-las, em qualquer circunstância" diz Miguel.  

"É essencial se comunicar bem com eles. A comunicação não para no diagnóstico. Precisamos ter certeza de que o paciente entendeu sua patologia, seu tratamento e as complicações que a doença e o tratamento podem acarretar", afirma. 

A medicina, reitera o estudante francês, se desenvolveu no período colonial, e alguns desses preconceitos ainda persistem. "É importante que as ciências sociais, a história e a sociologia estejam mais presentes nos cursos de medicina. Negro, em termos médicos, não quer dizer nada", diz.

 "Negro tem um significado sociológico. É importante, neste sentido, constatar como essas pessoas são tratadas, e qual é a percepção que se tem delas. A discussão para por aí. Ser negro significa ser alvo da negrofobia. E pronto."

RFI A RFI é uma rádio francesa e agência de notícias que transmite para o mundo todo em francês e em outros 15 idiomas.
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