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Mesma cueca e plano de vender o carro: as loucuras dos torcedores do Botafogo pelo sonho do Mundial
Clube alvinegro estreia neste domingo, 15, na Copa do Mundo de Clubes da Fifa
O amor pelo clube do coração é um sentimento que dificilmente vai conseguir ser compreendido por aqueles que são alheios a esse universo. A torcida do Botafogo, em especial, vive uma avalanche de emoções nos últimos anos. Desde 2021, quando em determinado momento a equipe teve dificuldades na disputa da Série B do Brasileirão, passando pela compra da SAF do clube pelo americano John Textor, a chegada de reforços de peso, a derrocada em 2023 e finalmente a coroação de toda essa trajetória com os títulos da Libertadores e do Campeonato Brasileiro em 2024.
- Essa reportagem faz parte do especial Volta ao Mundo em 90 Minutos, que conta histórias envolvendo as experiências de Flamengo, Palmeiras, Fluminense e Botafogo no Mundial de Clubes
Os dias de glória do Glorioso seguirão acontecendo neste mês de junho de 2025, quando o time da estrela solitária irá disputar a Copa do Mundo de Clubes da Fifa, nos Estados Unidos. A equipe do técnico Renato Paiva caiu no chamado 'grupo da morte', ao lado do PSG, atual campeão da Champions League, do Atlético de Madrid, da Espanha, e dos anfitriões Seattle Sounders, rival da estreia neste domingo, 15, a partir das 23h.
Porém, para quem foi invadido por uma enxurrada de sensações nas últimas temporadas, não há 'grupo da morte' que coloque medo. "Eu digo para as pessoas que a gente vai ganhar do PSG e estou sendo tachado de maluco por isso. Lógico, acho que isso é mais uma vontade do que uma análise de futebol, mas a expectativa é que faça um bom campeonato, sabendo que não é impossível de classificar". As palavras são de Bernardo Baptista, advogado carioca, de 35 anos, e torcedor fanático do Botafogo.
Bernardo estará nos Estados Unidos para escrever mais uma história ao lado do Glorioso. Também contará com a presença do pai, Sérgio Luiz, o precursor da família pela devoção ao time de Mané Garrincha. "Meu pai se considera escolhido porque não tinha ninguém da família dele que era botafoguense. Meu avô e meus tios são vascaínos. Eu sou o primeiro filho. Então, com dois, três anos de idade, ele já me levava ao Maracanã, que era de cimento. Eu tenho essas lembranças", descreve o advogado, que já perdeu a conta de quantos jogos na vida já esteve em estádios para acompanhar o Botafogo.
Uma partida, porém, que jamais sairá da lembrança de Bernardo ocorreu durante a Libertadores de 2017, quando o Botafogo encarou o Nacional-URU pelas oitavas de final. No Estádio Parque Central, em Montevidéu, o carioca ficou 'famoso' por vestir um gorro do Peñarol, maior rival do Nacional, junto com um amigo. A atitude lhe rendeu momentos de apuros.
"Compramos um gorro do Peñarol e colocamos no bolso interno do casaco. Passamos na revista e usamos o gorro durante o jogo. No dia seguinte, ficamos sabendo que mostraram essas imagens na transmissão local e também saiu em um jornal 'hinchas do Peñarol na torcida do Botafogo' com a nossa cara circulada. A gente acabou sendo até reconhecido, meu amigo tirou foto. À noite, eu estava andando na rua e um taxista passou, abaixou o vidro e me xingou", relembra.
Bernardo nutre idolatria pelo ex-goleiro Jefferson e pelo volante Gregore. A opinião é corroborada pelo corretor de imóveis Daniel Sá, de 28 anos, também apaixonado pelo Alvinegro. "Volta e meia eu mando mensagem no Instagram dele (Jefferson). Acho que ele nunca vai ver, mas eu mando. É um cara que tenho muita gratidão", comenta Daniel. "Nas minhas peladas eu jogo de volante também, então tenho um apreço especial pelo Gregore e pelo Marlon Freitas. Mais pelo Gregore porque ele é pitbull mesmo, se tiver que dar carrinho e sair sangrando de campo, ele vai fazer", diz.
Em 30 de novembro de 2024, diante do Atlético-MG, na final da Libertadores, no Monumental de Nuñez, na Argentina, Gregore foi expulso com somente 30 segundos de jogo. O lance, que tinha tudo para ser um pesadelo, marcou a vida de todos os botafoguenses, mas tornou-se ainda mais especial para Daniel, que fez uma tatuagem de Gregore golpeando Fausto Vera, do Galo.
"Não foi só uma expulsão. Aquilo foi uma virada de chave na energia do botafoguense como um todo. Eu senti na arquibancada que a gente não se abateu. Foi surpreendente. Esse momento da expulsão do Gregore mudou a energia do clube, que era muito pesada há muitos anos" --Daniel
Seguindo a mística gloriosa, tanto Daniel quanto Bernardo mantêm superstições para os jogos. Sempre a mesma camisa, cuecas ou tênis iguais. Porém, ambos ressaltam que o pessimismo peculiar aos botafoguenses está ficando para trás. "Tem que ter personalidade para ser Botafogo. Tivemos muitas eliminações, ilusões, em 2023, que foi o pior ano da minha vida, não gosto nem de falar... mas chegou a hora de dar a volta por cima", conta Daniel. "2023 me fez ser contra superstições", complementa Bernardo.
A paixão pelo Botafogo é tamanha que o corretor não tem memória do último jogo a que não assistiu do clube do coração. Por outro lado, em um momento de dar asas ao pensamento, Daniel tem na ponta da língua o que fará caso o Botafogo chegue à final da Copa do Mundo de Clubes.
"Eu não consigo nem imaginar, mas chegando na final provavelmente eu vou ter que vender o meu carro e ir para os Estados Unidos. Vai ser algo fora de cogitação para qualquer clube do Brasil. Nenhum torcedor, seja do Palmeiras, Flamengo ou Fluminense, está esperando que o time avance muitas fases. Então, se o Botafogo chegar à final vai ser um feito marcante, histórico. Mesmo que não venha o título. O que posso garantir é que eu estaria lá, de uma forma ou outra. Posso me endividar, vender carro, vender roupa, vender tudo, mas se chegar, eu estarei, com certeza", promete Daniel.
Se a final do Mundial ainda é um sonho um pouco distante, as lembranças da final da Libertadores são guardadas com riqueza de detalhes pelos dois. Os dias vivenciados em Buenos Aires despertam comoção.
"O gol do Luiz Henrique é o mais importante da nossa história. Quando o Gregore foi expulso, o meu mundo entrou em suspensão. Eu fiquei dessa forma. Eu não estava desesperado, nem nervoso, estava só acompanhando. O jogo não ficou ruim para a gente, o Botafogo se organizou. Quando sai o primeiro gol é uma catarse muito difícil de explicar. Qualquer vídeo que eu veja os lances daquele dia, os gols, é impossível não me emocionar. Só de contar já vêm muitas sensações", descreve o advogado.
"Onde eu estou, faço questão de falar que sou Botafogo. O Botafogo, pode parecer clichê, mas é a minha vida. Enterro, casamento, eu fico de olho no celular... essa é a melhor definição do Daniel: ser botafoguense" --Daniel
"A minha memória é muito boa, mas as minhas lembranças são mais do antes e depois do jogo. Durante o jogo acho que a minha mente se concentrou para viver aquele momento, estar 100% ali. Eu esqueço, por exemplo, as minhas reações durante o jogo", conta Daniel, que admite o fato de ser torcedor do clube como um traço inegociável da sua personalidade.
O clube mais tradicional, como é exaltado pelos fãs, não tem torcedores; tem devotos. Bernardo e Daniel são exemplos de como o amor pela estrela solitária é capaz, notadamente, de atravessar família, gerações e registrar memórias sem um fim à vista. Ou melhor, com brilho da chama alvinegra sendo sempre o norte da vida de cada apaixonado.